Esse não é mais um Guia de Praga
Mas pode ser que no final dê vontade de tomar uma cerveja do alto de um prédio na capital tcheca. República Tcheca, 28 de junho de 2022.
Expectativa vs Realidade
Cheguei em Praga debaixo de chuva, num voo que atrasou 3 horas pra sair de Budapeste e me desembarcou na cidade já anoitecida. “Vou pro hotel de metrô mesmo assim, não tem como dar errado". Tinha. Fui parar do outro lado da cidade.
Expectativa: chego plena e assisto ao final de tarde laranja no caminho do aeroporto até o centro. encosto minha cabeça na janela e, conforme o trem desliza em direção à estação central, percebo a magnitude da cidade dos cem pináculos, penso: “caramba. essa cidade é tão linda quanto dizem, mesmo”. me instalo no hotel, um bar dos arredores me convida pra entrar e vou ao encontro dela: a primeira cerveja tcheca. ela é implacável. volto pro hotel completa, com a plenitude que os ares de uma cidade inédita e um copo de cerveja podem oferecer, durmo na paz dos anjos e acordo disposta pro dia de trabalho amanhã.
Realidade: chego no hotel encharcada, depois da meia noite, peço a comida que ia chegar mais rápido e acerto na opção mais apimentada do delivery.
Many beers on tap! Welcome!
Eu era muito curiosa por Praga. Desde que soube que iria voltar pro velho continente a trabalho e teria um intervalo entre um evento profissional e outro, foi o primeiro lugar que escolhi para essa aventura que vamos chamar de Nômade Digital Por Algumas Semanas 2022, ou NDPAS 22, ou desnomadismo mesmo, já que de nômade tenho nada e escrevo essa história do sofá da minha casa.
Queria Praga porque vibrava com a ideia de conhecer um dos centros históricos mais preservados da Europa, tinha ouvido falar maravilhas, então cheguei de coração aberto e expectativas altas para descobrir se é verdade que a cerveja lá é tão barata como dizem? . Também li que era um destino bem andável, que uma vez hospedada no centro dava pra fazer tudo a pé. Viajar a trabalho pede um planejamento um pouco diferente, adiciona-se à equação da viajante ter uma "estrutura decente pra trabalhar" e "consigo aproveitar o lugar nas horas livres?". Praga parecia uma escolha promissora pro desnomadismo.
Depois da chuva que proporcionou as desventuras da noite anterior, no dia seguinte o céu estava limpo e sorria. Entre uma reunião e outra, fui em busca do meu primeiro café. Saí na Rua Dlouhá com olhar de criança prestes a entrar num brinquedo de parque de diversão.
Eu queria me encher de tudo, do barroco dos prédios, da escrita tcheca nas placas de transito que me era e segue sendo incompreensível, do cheiro de chimney cake, até daquela bicicleta de dois lugares amarrada no poste da esquina.
Eu não sabia da exata proximidade do meu hotel com a Praça da Cidade Velha, o coração da cidade, mas fui andando e quando percebi estava nela. E no meio de uma animada manifestação e/ou desfile pró união europeia.
Uma hora e uma manifestação depois, volto pro hotel com um pote de salada e um espresso tônica na mão. Desde quando eu tomo espresso tônica? Viajar faz coisa estranha com a gente, mesmo. Eu queria mais.
Fecho o último compromisso e volto pra rua. Começava o encontro oficial com a terra da Pilsen, a procura da cerveja perfeita, o pub crawl de uma pessoa só, a busca da plenitude que os ares de uma cidade inédita e um copo de cerveja podem oferecer.
A procura da cerveja perfeita
Me sentia pronta pra fazer concessões à regra que eu mesma criei em 2014 quando fiz minhas primeiras viagens longas sozinha.
"Regras da viajante solo: Não beber quando estiver viajando sozinha. Atualização: a menos que esteja na República Tcheca e/ou mais perto dos 30 anos do que dos 20 anos.”
Parece que cumpro todos os requisitos 🙃
A cidade é mesmo andável, em pouco tempo perambulando pelo centro histórico cheguei na ponte Charles, a mais antiga da cidade e hoje em dia exclusiva para pedestres.
Esse não é mais um guia de Praga, mas isso aqui é a elite da informação turística: a construção da ponte começou em 1357, no dia 9 de julho as 5 horas e 31 minutos. O rei Carlos IV escolheu essa data e hora pra ter números que são iguais lidos de trás para frente: 1357 9/7 5h31. Nós, as supersticiosas, já amamos o rei Carlos.
Um músico na ponte colocava tons dramáticos na minha travessia, que estava escaldante sob seus 30 e muitos graus. A cerveja nesse momento passava a ser uma esperança.
Tive meus momentos egotrip. Estava com sede, mas queria bons registros. Tentei selfies no meio do caminho e tive a certeza a habilidade não é mais a mesma (nota: mais uma regra da viajante solo por atualizar).
Atravessei a ponte e caminhei pelo Muro de John Lennon, pelo parque Kampa com várias galeras e gramas e sombras convidativas, vi uma pontezinha. Era um barzinho quase escondido me convidando pra entrar.
Bem, como nem tudo vem fácil, o cardápio era incompreensível e muitas pessoas tiveram a mesma ideia. Um pouco de paciência, um pouco de mímica, cheguei no balcão.
A primeira cerveja tcheca era implacável!
Voltei pro parque e ouvi um coro cantando quase que um aleluia e ri da trilha sonora.
Pub crawl de uma pessoa só
Do parque Kampa dá pra caminhar até a casa dançante. Dava pra ver que tinha gente lá no alto e sem qualquer sombra de duvida eu quis subir também - o pub crawl de uma pessoa só proporciona uns momentos interessantes.
Mais um angulo bonito desse lugar, agora do alto. Estou oficialmente bêbada apaixonada por Praga. Escolhi um canto e ficamos eu e uma Pilsner Urquell vendo a banda passar. Ir com expectativas altas pra um lugar carrega um certo risco, mas me sentia bem bêbada empolgada com esse cantinho do mundo. Estar lá em cima foi um daqueles momentos que a gente só respira e agradece.
Não contente com a quantidade de cevada no meu dia, próxima e última parada foi para um sorvete de cerveja. Não vou me alongar nisso, achei com gosto de nada com nada. O que to fazendo da minha vida?
Volto pro meu quarto tonta, suada, feliz e com uma mala que não ia se arrumar sozinha. O desnomadismo segue: tem mais República Tcheca pra ser explorada e amanhã cedinho sai o ônibus pra Cesky Krumlov.